– Senhor Alfredo, estou com uma entrega pro senhor.
Não tem ninguém em casa.
– Tem como você deixar na casa de grade aí da frente? Por
favor, procure pelo seu Ronaldo. Muito obrigado!
Pelo menos dessa vez o entregador ligou, porque da vez
que tive que retirar a encomenda no depósito foi uma canseira daquelas.
No carro cheio de crianças do teatro, deixei um
aqui, o outro desceu no quarteirão de lá, fiz questão de guardar
segredo. A destinatária da encomenda não fazia ideia da surpresa.
Depois de guardar o carro, tomar uma xícara de café,
esqueci de bater lá na residência do seu Ronaldo. Até que Júlia, sua netinha,
bateu no portão:
– Tio Farelo! Tio Farelo! O moço deixou isso pro senhor.
Era um embrulho simples, desses bem comerciais, padrão,
no interior envolvido com plástico bolha. Senti.
Agradeci a vizinha e o seu Ronaldo que se encontrava do
outro lado da rua. Nem bem fechei o portão e um berro:
– CLARICE! CLARICE! Olha só o que chegou. Vem ver,
depressa...
Assim ela fez, largou desenho, pincel e tinta, o chinelo ficou
pelos caminhos e VAPO! Pegou a encomenda e ali no escuro entre a garagem e a
sala foi abrindo o pacote e...
Clarice sorriu dos pés à cabeça. Pulos de satisfação.
Encantada. A menina comemorou com o corpo inteiro. Imediatamente foi para o
canto do sofá da sala. Sentou-se e começou a leitura. O mundo parou.
Na sala, aos olhos dos outros moradores, tudo se movia em
câmera lenta, ao redor daquela pequena leitora.
Em seguida, ajeitou a almofada, esticando os pés e,
segurando o livro, eis que se desligou por completo da realidade.
A mãe que assista à telenovela dela pra lá. A irmã
que ficasse de papo com as amigas nas redes sociais. O pai que fosse preparar a
salada da noite.
Segundo a mãe, ela só fez uma parada na viagem, antes de
dormir. Nesse tempo, fugiu para o escritório e lá começou a desenhar,
inspirada, de forma livre. A leitura!
A forma como recebeu a encomenda, o mergulho nas páginas,
os traços das histórias que também vai compondo, tudo isso nos enche de
alegria.
A menina Clarice ainda não sabe, mas naquele outubro foi
ela quem presenteou os pais na Semana das Crianças.
... farelos por aí ...
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