Cada dia mais tolo

 

Para Paulo Fernandes

Com essa estranha mania de sair falando dos livros que leio, das descobertas da literatura contemporânea, desse meu encantamento pelos escritores e poetas, fui me envolver numa situação inusitada.

Foi no tempo da faculdade, há duas décadas. Antes de começar a aula, propriamente dita, o professor perguntou o que a gente estava lendo, no momento. Os colegas falaram de clássicos em língua estrangeira, outros ostentavam os lançamentos nas áreas da Linguística e Teoria Literária.

Quando chegou minha vez, disse que estava quase terminando de ler a obra “O amor que acende a lua” cujos textos eram diversificados, ora carregavam elementos da crônica; ora lembravam contos e, em muitos momentos, passavam a impressão de que eram ensaios. Todos da sala começaram a me olhar de um jeito estranho. Era como se fosse um ser de outro planeta que tivesse acabado de chegar ali. Paciência. Continuei.

Não só nas crônicas daquele livro, mas em tudo que o escritor produziu, o que mais me encanta é a forma como trabalhava as metáforas, compunha as alegorias a partir da Filosofia, culinária, poesia e jardinagens.

Ao ler os textos daquele título, a gente sempre esbarra em apontamento de Nietzsche, descansa os olhos da vida urbana em um passeio com o mestre Alberto Caeiro, um dos heterônimos  de Fernando Pessoa, tudo isso em uma linguagem, aparentemente, simples, porém envolvente.

À medida que eu falava, senti que toda sala olhava para mim e para o professor. Esse nada dizia, porém, sua cara de indiferença, descaso, que havia comido algo estragado era desoladora. A vontade de interromper o tempo de exposição do estudante empolgado era grande. O jovem aprendiz queria aproveitar cada segundo daquele instante de resenha. Só que chegou o momento do fim, foi quando ele sinalizou. Era tempo de começar a aula.

 – Só toma cuidado para não ficar tolo igual o autor dessa obra que indicou, ok? – disse com indelicada paciência.  

Não entendi foi nada. Alguns colegas seguraram o riso, outros ficaram chateados. Só no intervalo fui saber que aquele professor odiava com todas as letras o tal autor de quem eu falava com tamanho entusiasmo.

Mais tarde fui descobrir que, de um modo geral, Rubem Alves era bastante criticado no meio acadêmico. Tenho a impressão de que era por conta de suas ideias e enorme sucesso.

A propósito, finalizo esta crônica citando um aforismo de T.S Eliot, que está na obra “A alegria de ensinar”, também de Rubem Alves:

“Num país de fugitivos aquele que anda na direção contrária parece estar fugindo”.

Professor, estou ainda mais tolo.

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