a madrinha em cena





Meu menino carrega umas conversas atravessadas, assim de pacto com gente de outro mundo. Tá quase tudo nos desenhos que ele faz, escondido do pai, mesmo homem que acha que não tem mais solução o caso do Lany. É um caso perdido.  

            Eu nunca desisti. É isso que me traz aqui. Esse menino, a senhora vai vê, é de outro lugar. Eu num sei qual, mas é..

            Lá na Vila o danado é conhecido como “Mestre”, agora oia pra senhora vê! As outras mães ficam repetindo que meu Lany pensa demais, que vai acabar ficando doido.

O miúdo fala cantado, colorindo as pausas, vibrando com os pousos. Tudo tem ritmo nos tons que o “Mestre” escolheu para a vida.

– Ele pode fazer um teste por uns dias? É que o povo lá da Vila disse que a senhora ia ser a solução?

– Seja bem-vindo! Venham, venham todos! Venham conhecer o Lany! Será que ele é o personagem que falta para compor a peça do final do semestre? Dona Conceição, pode voltar para o trabalho. Lany vai ficar bem.  

No início, o menino era todo cheio de silêncio e atenção para os jogos dramáticos. A cada ensaio, seus olhos brilhavam mais e mais. Menos, cada vez menos triste, sem as sombras do barraco onde sobre sobrevivia com outras dezesseis pessoas.

Lany chegava cedo para aprender mais, conferir a marcação, treinar a entonação da voz, saber mais do perfil dos personagens.

Lany trazia o texto da peça com o maior cuidado do mundo, dentro de um saco plástico.

– Aqui dentro não suja, professora. Se caí no córrego não vai molhar. Tenho que cuidar daquilo que está mudando minha vida, não é verdade?

A professora ficou sem solo. O que se passava na cabeça do “Mestre”?

            – É dos novos amigos que você fala? O lanche está gostoso? Diga: o que vem mudando sua vida em tão pouco tempo?

            – É o teatro, professora! É o teatro! Só aqui sinto que sou alguém de verdade.

            A professora apenas abriu os abraços. Lany, agora, no ritmo da gratidão, correu lá e compôs o abraço.

Quando a mãe voltou, querendo saber do desempenho do miúdo, levou um susto daqueles:

– O que aconteceu? Lany fez alguma travessura? Cês tão chorando?

– Lany vai continuar conosco!

– Num tô acreditando. Esse menino só fala do cês lá na Vila. Só fica lendo umas páginas brancas que a senhora passou pra ele. Um papel aí pra entrar no time.

– Na peça.

– Ele conseguiu o papel, então?

– O “Mestre” não tem nenhum problema. Na verdade, Lany é um artista! E queremos que ele faça parte do elenco.

Daquele dia em diante, dona Conceição descobriu que um dos seus filhos nasceu para a Arte.





.. farelos por aí ... 

Crédito da imagem: http://portalamazonia.com/uploads/pics/beco-shutterstock.jpg

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