08h23

Há sete meses o educador e escritor Paulo Fernandes envia de bom dia lindas, poéticas e reflexivas mensagens para seus amigos. A intenção do artista é suavizar o dia dos seus leitores mais próximos.   

Paulo, alegria ser um dos seus amigos e poder receber essas “gotículas de literárias”! Elas chegam sempre na boa hora. Não vou mentir, dizendo que as leio todos os dias, religiosamente. Mas até dessa minha sinceridade você sabe; pois somos amigos e você respeita minhas ausências.

Caro D, não fique com ciúme! O Paulo foi meu primeiro leitor oficial, viu? Entre 13 e 14, acompanhou a jornada das publicações diárias. E por isso sou muito grato à confiança, à amizade e parceria dele.

Mudando de assunto...

Minhas sobrinhas gêmeas dormiram na nossa casa ontem. Rolou sessão de cinema, games, disputas e uma deliciosa rodada de pizza. E para completar: uma gostosa chuva de primavera.   

Elas ainda estão dormindo ao lado da nossa filha mais velha, a caçula com a mãe arrematando  o leite que busquei mais cedo na padaria, João Londrina está ajeitando os ferros de briga e eu vou me aquecendo para o freela que vai bancar parte das contas que guardam a vez.

 

Você consegue me acompanhar? 

“Aqui é braúna, não é qualquer estaca dessas porqueiras que aí estão.”

João Londrina conseguiu me acompanhar os 4 km do início do dia. Para nossa surpresa, também não abriu o bico, após correr seu primeiro quilômetro.

João Londrina topou o desafio e está caminhando comigo. Como acorda muito cedo, mas só pode começar a trabalhar, às 07h, quer destinar parte desse tempo ao exercício físico.

Foi ele quem me falou da beleza da flor de braúna, árvore resistente do cerrado brasileiro.

Ao longo da atividade, colocamos a prosa em dia, sonhamos com o fim da pandemia e, vez ou outra, aprendo com ele sobre a importância de se ter um compromisso com as coisas.

Sim, caro D, eu voltei à estaca zero. Graças a você, voltei a caminhar, a escrever diariamente e a ter múltiplas ideias. É muito bom encontrar um ritmo para a vida que segue.    

Abraços,

... farelos por aí ... 

 Adoraria que mesmo com essas turbinas de avião caindo em nossas cabeças, com esses ventos irônicos assoprando o bigode da nossa hipocrisia...

Amaria que ele voltasse para casa, chegasse arrancando os uivos dos vizinhos, que sacudisse os portões estragados da rua ...

Gostaria, claro, que ele nos deixasse pegar no colo, acariciar sua barriga que depois dessa ventura carrega o incêndio da fome.

Não. Ele não atendia pelo nome. Não deu tempo de colar o anúncio na rede. Quando voltamos ele se foi e parece que não vai mais voltar.

É, caro D, a saudade do nosso gato bateu.

... farelos por aí ...

09h41

 Caro D, quando surge uma ideia, venho aqui e a deixo aqui registrada.

Já que nós professores da rede privada não somos ouvidos pela imprensa, pela prefeitura, pelos políticos e, em alguns casos, nem pelos nossos próprios diretores; por que não escrever um livro de diário, retratando tudo que nós estamos passando nesse épico ano de 2020?

Será que alguma editora estaria disposta  a publicar o que nós estamos enfrentando?

Caso não queira, quero que fique registrado que o que nós estamos enfrentando é uma baita crueldade.

Se por um acaso alguém, além do autor,  estiver lendo esta página de diário e se interessar em saber o que estamos passando, entre em contato pelo blog.

Apresente-se e trocaremos algumas ideias.  

 

09h12

Desde a tarde de ontem, venho sentindo o prazer de ler um livro pelo puro lazer. “Bolero de Ravel”, de Menalton Braff, um romance que estava na lista de espera desde 2012.

Vou degustá-lo, aos poucos, em cada capítulo, perdendo-me nos labirintos do narrador-personagem em sua viagem obscura.

Estou apreciando tanto a narrativa que até entrei em contato com o autor via um e-mail atrevido, urgente. Caso o Menalton responda, contarei aqui.   

A caminhada ficou para o período da tarde/noite. É o Dia das Crianças e eu minha esposa ficamos por conta de preparar, no capricho, o banquete desta data tão especial.

Celebrar todas as datas especiais faz parte da tradição da minha família. Ao contrário do que os extremistas dizem por aí, meu caro D, ritual e tradições são essenciais ao fortalecimento dos laços.

Dê-me licença que agora vou ali comer uma fatia de melancia.

... farelos por aí ...

PS: a imagem diz respeito ao concerto de tango em uma releitura da peça musical "Bolero de Ravel". 

 


11h21

 Fiz de tudo para me manter longe da tela do computador no dia de ontem. Um sábado, a saber.

Estive-me envolvido com lápis, borracha, lapiseira, caneta, papel ... muito papel. Foi incrível, meu caro D!

 O dia sorriu para mim como a saudação:

– Seja bem-vindo à revolução analógica!

Estou pensando a respeito dessa revolução, após ler o artigo sobre o uso inadequado das redes sociais.

Desconectado, longe das redes nessa semana, estou aproveitando para curtir minha família, nossa casa.

Ah, meu caro D, nesse quarto dia, andei em ritmo razoável 4 KM e corri meu primeiro KM de modo ininterrupto.

Devagar, com dificuldade, vou avançando e saindo da penumbra.

Ando “podando meu jardim”.

... farelos por aí”

 10h52

Bach é um dos nomes que mais tem frequentado meus últimos dias.

             Bach da Ave Maria que ilumina meus bons dias ao Universo, passando por Jesus, a 

alegria dos homens; até chegar aos florais, pingados de gota em gota na minha garganta. 

Garganta santa!

“Exausto”

 

Eu quero uma licença de dormir,

perdão pra descansar horas a fio,

sem ao menos sonhar

a leve palha de um pequeno sonho.

Quero o que antes da vida

foi o profundo sono das espécies,

a graça de um estado.

Semente.

Muito mais que raízes.

 

             Com este poema de Adélia Prado, caro diário, você entende porque me receitaram Bach.


            Todos os professores, no momento, precisam voltar ao estado semente.

 


... farelos por aí ...

 


 

                                                                                18h51

Ao final da tarde, tomei a decisão de me desconectar das redes sociais entre os dias 10 e 18 de outubro.

A prova está no meu Instagram: @farelodequiat

Ao saber dessa minha atitude, minha filha de 10 anos respirou aliviada e disparou para a irmã caçula.  

– Graças a Deus vamos ter nosso pai de volta. Pelo menos uma semana ficaremos sem aquele robô, Cla!

Isso dói. Dói muito, meu parceiro. Só quem é professor da rede particular no contexto da pandemia do novo Coronavírus compreende o que estamos passando. 

(Sem comentários)

Nessas horas, dou graças a Deus por também ser escritor e poder conversar com meus ilustres leitores, como ocorreu no final dessa manhã.

Hoje fui muito bem acolhido pelos leitores do 6º Ano, alunos do Colégio Espanhol Santa Maria, de BH. Foi mágico, distinto e encantador.

Só para você sentir o gostinho do quanto foi especial, uma aluna me recebeu cantando e tocando “Aquarela”, de Toquinho e Vinícius de Moraes.


Além das perguntas inteligentes e comoventes sobre meu penúltimo livro, “Um estranho para o céu”, recebi quase no final do bate-papo uma parte da Nona Sinfonia de Beethoven. 

Inacreditável! Um garoto aí na casa dos seus 11 anos tocou essa peça no violão. Mágico!

Agora, à noite, vou fazer minha caminhada; pois não foi possível pela manhã. Dormi mais do que a cama. Resultado do 1º dia de exercício (ontem).

Eh, Diário, para quem não dormia... eu até sonhei, meu parceiro.

 

... farelos por aí ...

 

 

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